Pilhas de areia: Robustas, mas frágeis

Pilha de areia.

Um sistema enganadoramente simples e que contudo serve de paradigma para a autoorganização crítica é a pilha de areia. O conhecimento intuitivo que temos deste sistema pode ser sumarizado da seguinte forma:

Estado subcrítico → estado crítico

  • Adicionemos lenta e uniformemente um grão de areia de cada vez sobre uma superfície plana. Em breve estes começam a empilhar-se uns sobre os outros criando uma pilha de declive suave.
  • De vez em quando, o declive fica demasiadamente íngreme algures na pilha e alguns grãos deslizam causando pequenas avalanches. À medida que mais areia é adicionada e o declive da pilha aumenta, também o tamanho médio das avalanches aumenta.
  • O declive (médio) da pilha cessa de aumentar quando este atinge o valor correspondente ao ângulo de repouso. Quando mais um grão de areia é adicionado à pilha, este pode então provocar uma avalanche de quaisquer dimensões, incluindo eventualmente uma avalanche "catastrófica".

Estado supercrítico → estado crítico

  • Por outro lado se o declive inicial for maior do que o ângulo de repouso, então uma avalanche de proporções "castatróficas" ocorre de seguida. Este é o estado supercrítico, o qual colapsa até que se atinja o estado crítico.

As evidências, tanto computacionais como experimentais, apontam no sentido de que o número de avalanches em função do tamanho obedece a uma lei de potência, pelo que podemos dizer que quando o declive da pilha de areia atinge o ângulo de repouso, esta está num ponto crítico.

Suponhamos, por exemplo, que depois do sistema ter atingido o ponto crítico, começamos a deixar cair areia molhada. A areia molhada tem maior atrito que a areia seca (é por essa razão que é mais fácil fazer castelos de areia molhada), pelo que durante algum tempo as avalanches são pequenas e localizadas e menos areia chega ao fundo da pilha. O declive médio da pilha aumenta até se atingir um novo estado crítico. De forma semelhante, se secarmos a pilha de areia, há um aumento temporário de avalanches de grandes dimensões e o declive da pilha torna-se cada vez mais suave até atingir o novo estado crítico.

Independentemente do tipo de areia e das condições iniciais, a pilha de areia evolui inexorável e espontaneamente para um ponto crítico. Contrariamente ao fluido em equilíbrio térmico que requer uma 'sintonização' precisa da pressão e da temperatura para o colocar no ponto crítico, a pilha de areia é um sistema fora do equilíbrio (a areia entra e sai do sistema) que é conduzido a um ponto crítico pela sua dinâmica intrínseca, com o modesto esforço de se deixar cair a areia lenta e uniformemente. O estado crítico da pilha de areia é um atractor e a variação de alguns parâmetros do sistema faz saltar a pilha de areia para um outro ponto crítico, pelo que dizemos que a pilha está num estado de autoorganização crítica.

Este fenómeno foi identificado pela primeira vez por Per Bak, Chao Tang e Kurt Wiesenfeld num trabalho pioneiro publicado em 1987, na Physical Review Letters, e é considerado como sendo um dos mecanismos que pode estar por detrás do aparecimento dos fractais, das leis de potência e da complexidade na Natureza.