Autoorganização: Da Física à Biologia e às Ciências Sociais

A autoorganização é um processo através do qual um sistema passa a exibir padrões e estruturas à escala global, que não são o resultado directo da manipulação de parâmetros de controlo exteriores ao sistema, mas antes emergem, em certas condições, das numerosas interacções locais entre os seus componentes. Mais ainda as regras que especificam as interacções entre os elementos do sistema são executadas usando exclusivamente informação local. Por outras palavras, o padrão é uma propriedade emergente do sistema e não uma propriedade imposta ao sistema por uma influência externa.

Dunas
Dunas

Padrões espácio-temporais

Os exemplos mais claros de autoorganização apareceram em Física, onde o conceito surgiu, pela primeira vez, no estudo de sistemas complexos. No entanto a autoorganização também é relevante em Química, onde é usada como sinónimo de autoconstrução molecular, e o conceito é central na descrição de sistemas biológicos a todos os níveis: desde o nível subcelular até ao nível dos ecossistemas. Há ainda exemplos de comportamento autoorganizado em muitas outras disciplinas, das ciências naturais às ciências sociais, como a Economia ou a Antropologia.

RemoinhoPinguins adélia a marchar em fila indiana.

Em Termodinâmica Fora do Equilíbrio, a formação de padrões é um dos paradigmas da autoorganização. Exemplos clássicos incluem a turbulência e a convecção em dinâmica de fluidos, a formação de estrutura em Astrofísica e Cosmologia, e os processos de reacção-difusão.

A autoorganização em sistemas fora do equilíbrio parece desafiar o paradigma da desordem crescente, baseado na Segunda Lei da Termodinâmica. Como é que a evolução de um sistema pode criar ordem, se a entropia mede a desordem e tem que aumentar sempre? Contudo, é possível reduzir a entropia de um sistema transferindo-a para o exterior e é isto o que acontece em sistemas abertos: Existe um fluxo de matéria ou de energia através do sistema que transporta o excesso de entropia para o exterior. As estruturas mantidas por este fluxo de entropia chamam-se estruturas dissipativas. Ao contrário das estruturas de equilíbrio, as estruturas dissipativas (exemplos: a convecção e as reacções do tipo de Belouzov Zhabotinski) são ordenadas numa escala muito diferente da escala dos átomos ou das moléculas.

Com base neste argumento simples, parece então que um sistema isolado não pode reduzir a sua entropia e só os sistemas abertos poderiam autoorganizar-se. No entanto, um sistema fechado pode ordenar-se macroscopicamente ao mesmo tempo que aumenta a sua entropia. O truque é ‘rearranjar’ a desordem do sistema, um pouco como quem, antes de receber visitas inesperadas, põe à pressa tudo o que tem inconvenientemente espalhado pela casa, no quarto ‘das arrumações’. Na linguagem da Física, dizemos que alguns dos graus de liberdade macroscópicos do sistema podem ordenar-se à custa da desordem microscópica.

Molécula de ADN.
Molécula de ADN.

Em muitos casos de autoorganização biológica, por exemplo no metabolismo, a organização crescente das macromoléculas é mais do que compensada pelo aumento da entropia de moléculas mais pequenas, como as de água. Contudo, ao nível do organismo, e em escalas de tempo suficientemente grandes, os sistemas biológicos são abertos: consomem alimentos e exportam resíduos para o exterior.

A autoorganização é um tópico verdadeiramente multidisciplinar. A matemática e, em especial, a computação jogam também um papel crucial no estudo destes fenómenos. Sistemas abstractos, como autómatos celulares, agentes ou redes complexas e alguns aspectos da computação evolutiva e da vida artificial partilham características dos sistemas autoorganizados, proporcionando modelos naturais para as investigar, e estão na base de técnicas indispensáveis nas aplicações à Física, à Biologia e às Ciências Sociais.

Padrões sem autoorganização

Os padrões impostos por condições externas, como os dos novos materiais com ordem induzida por ‘templates’ (moldes), ou o do aplauso sincronizado pela batuta de um maestro, são exemplos de padrões espaciais e temporais sem autoorganização.

Bando de gansos a voar na característica formação em V.Rebanho de ovelhas.

O rebanho de ovelhas, na imagem à direita, não é autoorganizado. As ovelhas seguem um conjunto de instruções ou rotinas pré-determinadas pelo pastor. Pelo contrário, o bando de gansos selvagens, na imagem à esquerda, é autoorganizado. O papel do 'líder' não é relevante. De facto, não existe um líder e todos os gansos, incluindo aquele que parece liderar, são equivalentes.

Na autoorganização não há um comando central, toda a informação é local. O padrão emerge como resultado das interacções entre os constituintes do sistema.