Relações de incerteza de Heisenberg

Na descrição não quântica do movimento de um pequeno objecto faz sentido dizer que num certo instante ele está em determinado ponto. Nesse mesmo instante também é possível determinar a sua velocidade. Dito por outras palavras: em cada instante posso saber onde está e para onde vai.

Imaginemos agora que estudamos o movimento de um electrão. Já sabemos que a descrição quântica deste sistema é feita, em cada instante, por uma função de todo o espaço, Ψ(x) . Esta função, designada por função de onda, é em geral complexa e o seu módulo representa a densidade de probabilidade. Isto quer dizer que se considerarmos um ponto x0 e um intervalo de “tamanho” Δx  em torno de x0 a probabilidade de encontrarmos o electrão nesse intervalo é |Ψ(x0)Δx .

A figura seguinte mostra alguns exemplos de funções de onda simples.

Função de onda ao longo do tempo.
Função de onda ao longo do tempo.

No primeiro exemplo a função é praticamente zero para quase todos os valores de x e só é não nula numa pequena vizinhança do zero. A probabilidade de encontrar o electrão fora dessa região central é portanto zero. Quanto mais estreito e alto for o pico mais localizado está o electrão. Assim as funções sucessivamente representadas na figura correspondem a electrões cada vez mais “deslocalizados”. A função de onda de um electrão completamente “deslocalizado”, isto é, um electrão que tenha igual probabilidade de ser encontrado em todo o eixo dos x é:

\Psi(x)=\exp(i\frac{mv}{\hbar}x)

onde m é a massa, v a sua velocidade e ħ é a constante de Planck dividida por 2π. A este electrão corresponde uma velocidade bem determinada v. Na verdade, conhecer o produto da massa pela velocidade, grandeza a que se dá o nome de momento linear, p = mv , é mais importante e mais geral do que saber a velocidade. Por esta razão continuaremos esta exposição em termos de x e p. Então, o exemplo anterior mostra o caso de um p bem definido e um x completamente indefinido.

Modelo da nuvem electrónica para o átomo de hidrogénio.
Modelo da nuvem electrónica para o átomo de hidrogénio.

Ondas localizadas, como as representadas na figura, correspondem a uma sobreposição de um número muito grande de ondas do tipo da anterior, com valores de p diferentes. Mas quão diferentes? Imaginemos que sobrepúnhamos um número infinito de ondas com valores de p a variarem num intervalo de largura Δ centrado em p0 . O Ψ assim obtido corresponderia a um electrão localizado numa região de largura Δx. O que a teoria mostra, e a experiência confirma, é que electrões com grande dispersão no momento correspondem a pequena dispersão na posição e vice-versa. Grande dispersão no momento significa que são electrões que podem ter momentos muito diferentes. Pequena dispersão na posição significa que são electrões para os quais a posição é bem determinada. Os Δx e Δp podem ser encarados como incertezas na determinação da posição e do momento, respectivamente. O que a teoria mostra é que não podemos ter simultaneamente ambos arbitrariamente pequenos. Teremos sempre

\Delta{x}\bullet\Delta{p}\ge\frac{1}{2}\hbar

Esta é uma das Relações de Incerteza de Heisenberg. O que se disse para a coordenada x e a componente do momento linear segundo o eixo dos x dir-se-ia do mesmo modo para a posição segundo y e z e as respectivas componentes do momento.

Onda de probabilidade.

Estas relações são de tal maneira famosas que muitas vezes são quase identificadas com a própria Mecânica Quântica. Pior ainda! Têm sido vezes sem conta usadas erradamente e até mesmo abusadas por outros cientistas fora da Física. As relações não dizem que o conhecimento é sempre “nebuloso” e outras coisas no género. Posso determinar o momento dum electrão com a precisão que quiser, ou melhor, com a precisão que o meu engenho e arte forem capazes. De igual modo posso medir a sua posição. O que as leis da Física nos dizem é que existem variáveis que não se podem medir simultaneamente com precisão arbitrária.